quinta-feira, 23 de fevereiro de 2006

Representações subjetivas


Que imagem temos de nós mesmos? Será que não vivemos representando tal qual atores num teatro? Quem somos nós atrás de nossa aparência? Essas questões me vem incomodando já faz algum tempo. Será que somos simplesmente aqueles que representamos ser? E se escolhêssemos ser outra imagem, outra representação? O problema parece se complicar. A contingência da representação que fazemos de nós mesmos nos remete á uma liberdade irrestrita, quero dizer, a imagem que temos de nós se vincula exclusivamente á nossa liberdade.

Não quero parecer com essas palavras um idealista. Não estou dizendo que escolhemos livremente nascer em tal lugar, ser homem ou mulher, negro ou índio, essas coisas são o dado bruto, a manifestação da contingência dos fatos, a facticidade. Em verdade, não pode haver liberdade sem a facticidade. É ela que nos dá a escolha. Entendo liberdade como a autonomia do sujeito em fazer escolhas, exercer a liberdade é escolher entre alternativas. Não faz sentido dizer que não somos livres para voar como os pássaros, exatamente porque para o homem não existe essa alternativa. Liberdade envolve escolha, escolha envolve alternativas que só se manifestam na facticidade. Para ser livre preciso estar situado num ponto restrito da história, numa classe social, num círculo de pessoas, pertencer á uma etnia e assim por diante. Se digo que nasci homem, em tal país, em determinada família, não está ao meu alcance mudar isso, nunca esteve, mas é minha liberdade que me faz representar tal situação como eu a represento, dando seu valor e atribuindo seu sentido. O dado em-si não possui sentido algum, o sentido advém de uma escolha livre, uma atribuição subjetiva de significado. Por exemplo, um homem desempregado pode representar tal situação de numerosas maneiras. Uma delas é resignando-se, aceitando como um cristão a sua “cruz” e vivendo no sacrifício em nome da salvação, ou, revoltando-se contra a sociedade e roubando para alimentar seus filhos. As duas opções são possíveis, além de muitas outras, mas somente a liberdade de cada sujeito que o permitiu representar a dar significado a sua situação ao seu modo.

Posso ser objetado dizendo-se que a religiosidade do cristão ou a revolta do outro é motivada por uma influencia familiar, social, emocional, mas digo que em todos os momentos o sujeito representa sua situação livremente, e isso remete a uma escala infinita, digamos assim, de escolhas livres. O ser humano não é influenciado por nenhuma série determinista, nem por si mesmo. É a pura contingência de sua liberdade que o constitui e o encaminha à busca de si.


Antonio Felipe Silva

Um comentário:

Kyra disse...

Oi, me chamo Édina e sou psicóloga, fantástico sua forma de escrita e como articula seus pansamentos. Parabéns!!!