sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

El Passado. Dir Hector Babenco. 2007.

“A separação também pode ser parte de uma história de amor”. Este é o slogan comercial do filme O Passado do diretor Hector Babenco baseado no livro de mesmo nome do escritor argentino Alan Pauls. O passado é um filme intrigante e por isso alvo de numerosas críticas, a maioria negativa, advinda de variadas direções. De fato, Não se trata de um filme fácil. São numerosos os elementos que contribuem para a complexidade da trama e aquela sensação quando se saí do cinema, quase que unânime, de que há alguma coisa não resolvida. É exatamente a partir desta sensação que pretendo começar.

Rímini (Gael García Bernal) é um homem que foge dos estereótipos cinematográficos das grandes produções. Ele não é apenas fraco e dependente, mas possui uma fragilidade de infantil peculiaridade. Jovem tradutor bem sucedido é casado há doze anos com sua primeira namorada, Sofia (Analía Couceyro). Por outro lado, Sofia guarda por Rímini um afeto quase que materno. É importante levar luz ao fato de que, embora estejam casados há doze anos, o casal não possui filhos. A separação é um fato e surge no filme instantaneamente no momento em que o filme surge ao expectador. Não se explica porque há a separação, mas ela aparece como um fato sintomático de insustentabilidade das tensões de um casamento que ultrapassa uma década.

Uma vez, dada a necessidade dos protagonistas viverem por si, terem que retomar suas vidas independentemente um do outro, eles vão se revelando lentamente e uma 'casca' caí ao chão após a outra. É importante notar alguns aspectos do desenvolvimento da vida, posterior à separação, de cada um dos personagens. Rímini se vicia em drogas e se envolve, respectivamente, com uma modelo narcisista e doentia de ciúmes (que é atropelada fatalmente após ver Sofia beijando Rímini à força), e, com uma companheira de trabalho com a qual se casa e tem um filho. Neste ponto podemos lembrar a semelhança com alguns filmes de Alfred Hitchcock em que o protagonista se apaixona pelos traços da amante e sempre recria em mulheres diferentes o mesmo movimento intencional que lhe dirige a elas. Rímini manifesta sua dependência da atual esposa quando se vê com uma amnésia que o impede de trabalhar e fazer suas traduções. Sofia, por sua vez, diz se envolver com homens apenas por sexo, pois a imagem de Rímini ainda ronda seu presente. A sensação de que há sempre algo não resolvido está na conclusão, que outrora os protagonista acreditaram levar a cabo, que sempre se torna uma questão em aberto a cada novo momento.

A razão de tantas críticas ao filme está num engano. O Passado não é um filme com pretensão de ser romântico. Ele é realista. Rímini não é um homem que agrada aos homens, pois está fora do ideal masculino. Muito menos Sofia, alguns a acharão desequilibrada e doentia, outros real em demasia. O Passado é um filme que mostra, sobretudo, que o passado não existe como um lugar, com um endereço situado. O passado é simultâneo ao presente, reconstruído a cada instante sempre na atualidade, no aqui e no agora, fazendo o próprio presente ser também passado. A questão fundamental é que na vida tanto de Rímini como de Sofia o passado não perde a sua atualidade, ele é revivido no presente pedindo sempre nova atualização, embora, a todo instante fracassada.

Veja o trailer:


sábado, 15 de dezembro de 2007

Inland Empire. Dir. David Lynch. 2006


'Eu não sou quem você pensa!' Diz o esposo enquanto tenta estrangular sua mulher. Império dos sonhos de David Lynch está repleto de pontos de exclamação que vibram na mente do espectador. Um filme inteiramente gravado numa câmera digital Sony PD-150, tem a vantagem de possibilitar toda a flexibilidade que Lynch precisa para tornar o conjunto tempo/espaço da trama descontínuos, fragmentados, ao ponto da personagem principal dizer atônita: “Eu não sei o que veio antes ou depois. Não consigo distinguir o ontem do amanhã e isso está fodendo com a minha cabeça.”

A história é, em si mesma, pífia, banal e, teoricamente, sem grandes mistérios. O que torna o filme original é sua composição, como não poderia ser diferente quando se trata de David Lynch. Nikki Grace (Laura Dern) é uma atriz em baixa no mundo de Hollywood, mas vê a oportunidade de redenção de sua carreira quando é convidada para protagonizar um filme. No set de gravação entra em contato com um típico galã hollywoodiano com quem dividirá as cenas, o ator Kingsley Stewart (Jeremy Irons). O que ambos não sabiam é que o filme que almejam contracenar é um remake. Apartir desta descoberta dos protagonistas o filme começa tomar rumos espaço-temporais sinuosos. O fato do filme ser baseado numa lenda cigana e dos protagonistas da versão original terem sido assassinados de forma misteriosa assombra a fantasia dos nossos personagens. A ficção se funde com a realidade e se inicia o sonho. Não há controle do tempo, o ontem e o amanhã se tornam um misto confuso e indiscernível, o espaço é constituído por ambientes decadentes, periferias, moteis, casas suburbanas, e neste rodamoinho também o telespectador se torna refém de uma realidade que foge de si mesma, de um sonho que teima em não se concluir, de uma fantasia que beira ao caos.

A busca pela identidade, por um fundamento subjetivo, é inutil. a grande questão é que nunca se sabe bem quem se é. E pior, nunca se sabe quem é o outro. Não há lugar que reflita segurança nem tempo que soe o presente. É tudo líquido. Para Lynch, uma câmera desfocada mostra mais do que imagens nítidas e bem definidas. O indefinido é o modo próprio da substancialidade da trama. Se não se sabe quem se é, não se sabe, igualmente, até onde se pode ir ou o que se pode fazer.

Trailler

terça-feira, 17 de julho de 2007

La Vida Secreta de las Palabras. Dir. Isabel Coixet. 2005.



Acidentes. Tanto aquilo que dá motivo atual ao filme como aquilo que dá profundidade aos seus personagens são acidentes. Até aí nada pode nos surpreender, uma vez que fatos acidentais promovem a dinâmica da vida e nos libertam da rotina. No filme A Vida Secreta das Palavras da diretora Isabel Coixet (Minha Vida Sem Mim, 2003) percebemos esta rotina de forma gritante na vida de Hanna (Sarah Polley) que há anos não falta nem se quer um dia ao seu trabalho, conservando os mesmos horários e até o mesmo cardápio sempre (Arroz, frango e maçã).

Um incidente numa plataforma de petróleo trata de unir a personagem Hanna com o enfermo Josef (Tim Robbins), que sofreu sérias queimaduras numa explosão. Orientada por seu patrão à tirar férias, Hanna vai para um pequeno povoado costeiro onde tem a ocasião de trabalhar como enfermeira por conta dos acontecimentos. Acometido por uma cegueira temporária, Josef aos poucos descobre a personalidade da introvertida Hanna, que se esconde atrás de seu próprio silêncio.

Devemos chamar atenção para alguns pontos do filme. A revelação da personagem Hanna é lenta e gradual, sua vida é marcada pela solidão e pelo mecanicismo rotineiro de seu trabalho numa linha de produção. Já com 30 anos, sua deficiência auditiva dá pistas de seu passado reprimido que se revela ao espectador ao mesmo tempo que para Josef, que se encanta a cada dia com a mulher que se revela para ele quase que num jogo. Josef, sem poder enxergar, só pode ter como referência de Hanna o inglês carregado de sotaque, seus movimentos delicados e suas palavras minuciosamente escolhidas. Josef percebe que há algo de muito errado com Hanna, mas não sabe como suas atitudes podem realmente ajudá-la. O roteiro do filme é genial, não permitindo que informação alguma sobre o passado de Hanna seja revelado antes dos momentos mais oportunos, mas só depois deste momento, quando nenhum mistério existe entre eles, será possível que tanto Hanna como Josef possam depositar confiança recíproca.

Trailer:

segunda-feira, 2 de julho de 2007

O Labirinto do Cubo

Após uma maratona de filmes na casa do Heraldo, onde assistimos o filme italiano Ladrão de bicicletas, seguido de Lars Von Trier, Dançando no Escuro, e a trágica comédia brasileira Durval Discos, pensamos que poderíamos fazer com nossas próprias mãos um filme. Esse video corresponde a primeira discussão sobre essa idéia.

Estavam presentes, além de mim, A historiadora Ana Emília; o cientista da computação André Lima; o estudante de rádio e TV e dono do ap, Heraldo; o estudante de multimeios, Vitor; e; por fim, a estudante de enfermagem Camila Negrão.
Espero que o projeto dê certo!

Veja o albúm de fotos desta maratona aqui.

quinta-feira, 7 de junho de 2007

Things You Can Tell Just by Looking at Her. Dir. Rodrigo García. 2000.


Coisas Você Pode Dizer Só De Olhar Para Ela” é um filme intrigante. Disposto em cinco curtas que tratam da vida de cinco mulheres, que ao acaso, tem suas vidas, de uma forma ou de outra, influenciada entre si de uma maneira marcante e definitiva. O filme é um belo painel sobre a solidão feminina e a grande sacada de Rodrigo García está em mostrar cada personagem se fundindo dentro de um único gênero.

Seja a história da Dra. Elaine Keener (Glenn Close), ansiosa e angustiada à espera um telefonema que nunca acontece; seja a história da gerente de banco Rebecca (Holly Hunter) que aparentemente parece não trocar sua independência por nada, mas não se contenta em ser apenas uma amante que se descobre grávida e perdida; seja a história de Carol (Cameron Diaz) uma jovem atraente cega que se pergunta da razão de nenhum homem querer algo sério com ela; entre outras, todos esses fragmentos, são ricos de pequenos detalhes, o mais notável são as expressões faciais, os closes de câmera e a excelente atuação das atrizes.

Numa das cenas mais belas e significativas do filme, a cartomante Christine Taylor (Calista Flockhart) lê o destino da Dra. Elaine e seu discurso envolve o que a doutora é, o que ela pensa ser, o que ela finge ser, como ela é boa em fingir, o que ela espera, o que vai acontecer e o que ela sente. O surpreendente é que talvez esse diagnóstico particular de Elaine feito pela cartomante é aplicado à todas as outras mulheres que compõem o filme, até mesmo às personagens periféricas, como a sem teto Nancy (Penelope Allen) ou a namorada (Valeria Golino) da própria Christine que se encontra em fase terminal.

O filme lembra na sua intenção “The Hours”, embora este seja mais fragmentado. É bom considerar também os cinco títulos dos contos: "This is Dr. Keener", "Fantasies about Rebecca", "Love Waits For Kathy", "Goodnight Lilly, Goodnight Christine", "Someone For Rose", todos se completam e mostram uma unidade genérica composta por cada uma das personagens. Sutilezas femininas e emoções entaladas na garganta não faltam nesse filme.

Trailer

terça-feira, 5 de junho de 2007

La Tigre e la Neve. Dir. Roberto Benigni. 2005.



Não poderia um filme sobre um poeta começar de outra forma a não ser por meio de um sonho, e não é um sonho qualquer, mas o sonho que o une à mulher de sua vida. Sonho este que Attilio di Giovanni (Roberto Benigni) atualiza todas as noites onde quer que ele repouse. A cena é fabulosa, além da arquitetura do ambiente, Tom Waits se responsabiliza pela canção. Attilio di Giovanni sonha se casar com Vittoria (Nicoletta Braschi), que aparenta, na realidade, não ter qualquer interesse nele. No entanto, no sonho ela sempre o surpreende e não obstante os contratempos típicos de “sonho sem pé nem cabeça”, como o celular que toca ou o guarda que interfere por conta do carro mal estacionado, a cena não perde seu teor romântico, mas ao contrário, ganha uma fragrância lúdica própria de Benigni.


Attilio di Giovanni está longe de ser um daqueles tipos já bem conhecidos do cinema, aqueles figurões, como por exemplo, o “homem marlboro”, o “homem martini”, o “homem marcedes, bereta”, e por aí a fora. Attilio é um poeta por necessidade, ou melhor, por natureza. Explicando para suas filhas por que era poeta ele diz que precisava comunicar aos outros aquilo que ele sentia, da forma como sentia, dar o devido valor para aquelas coisas que tem esse valor. Talvez aqui possamos encontrar uma pista da razão pela qual um filme usa uma guerra tão recente apenas como um pano de fundo para uma comédia. Não é tratada durante toda a narrativa a questão do absurdo de um conflito armado ou a legitimidade de uma invasão política e econômica. Pelo contrário, Benigni quer deixar muito evidente que não é esse o objeto focal de suas câmeras, coisa que fica muito clara em uma cena em que Attilio e seu amigo Fuad (Jean Reno) contemplam a lua e o céu numa linda noite em Bagdá enquanto na periferia da imagem notamos dezenas de bombas sendo lançadas ao ar.


Informado que Vittoria foi ferida em Bagdá, Attilio imediatamente viaja para o oriente para cuidar dela. Inconsciente, Vittoria, numa cama de um hospital semi-destruído, não possui todos os medicamentos necessários para sobreviver e Attilio, mesmo sendo desesperançado pelo médico, atravessa Bagdá para com um último esforço salvar a vida de sua amada, que nem saberá quem a salvou. Os elementos românticos do filme não tiram sua originalidade e sempre se abre um espaço amplo para criar surpresas no espectador.

Veja o Trailer:

terça-feira, 29 de maio de 2007

Code Inconnu. Dir. Michael Haneke. 2000.


Quando conhecemos o potencial de um grande diretor vamos ao cinema esperando sua superação própria e aumentamos nosso rigor em formular juízos. “Código Desconhecido” é um filme que mostra toda a qualidade do diretor alemão Michael Haneke, que conhecemos outrora pelo filme “La Pianiste” (2001).

O roteiro apresenta uma fragmentação substancial, no entanto, o filme não fica confuso por conta disso; coisa muito difícil de ocorrer com filmes multiplots. A composição da narrativa tem três eixos, três contos que acontecem em simultâneo e encontram uma “esquina parisiense” onde os três focos narrativos convergem. O primeiro conto é composto por Anne Laurent, brilhantemente interpretada por Juliette Binoche, seu namorado (Thierry Neuvic), um fotógrafo de guerra, seu sogro e Jean, seu genro; o segundo por Maria (Luminita Gheorghiu), uma imigrante romena sem teto que pede esmolas nas esquinas; e finalmente, o terceiro conto é composto por Amadou (Ona Lu Yenke), filho de um professor de surdos-mudos e de descendência africana.

Haneke optou que o ponto narrativo de convergência entre as três narrativas fosse abrupto e violento, surgido ao acaso. Enquanto Maria, sentada numa esquina, pede esmolas, o jovem Jean (Alexandre Hamidi), mostra todo o seu desprezo amassando um pedaço de papel e jogando sobre ela. A reação de Maria é a mesma que ela tem ao perceber que o Sol, assim como ontem, nasceu hoje, como se receber papeis amassados fosse algo habitual. Em sentido oposto entra em cena o jovem negro Amadou que agarra Jean pelo pescoço e o obriga a pedir desculpas. A cena é tensa e se finaliza com a polícia levando Amadou para a delegacia. No decorrer do filme os três contos voltam a se desenvolver de forma independente, mas o espectador pode perceber nitidamente as seqüelas de uma sociedade sectária fundada no preconceito.

A composição dos personagens é outro ponto que salta aos olhos nesse filme. A mais complexa é Anne Laurent, uma jovem atriz que busca uma colocação respeitável no circuito da fama. Ela atravessa sérias crises profissionais e amorosas. Em uma cena, após brigar com o namorado no supermercado, ela diz ter feito um aborto enquanto ele viajava, coisa que nem o namorado nem o espectador poderá saber se realmente é verdade. Enfim, encontramos personagens que comungam essencialmente nas incertezas com relação à suas próprias vidas. Embora sejam histórias paralelas e seus personagens sejam independentes uns dos outros, eles encontram pelo caminho um “código desconhecido” que lhes une num instante de suas vidas e deixam marcas inconscientes.

Veja o Trailer:


quarta-feira, 25 de abril de 2007

Caros leitores,

Quero pedir desculpas pelo meu desaparecimento. Isso se deve a três fatores:

  • Falta de tempo devido as minhas atividades acadêmicas e pessoais.
  • Impossibilidade de comparecer em cinemas.
  • Crise de criatividade.

Mas tudo isso é apenas um momento. Pretendo em breve voltar!

Saudações

quarta-feira, 4 de abril de 2007

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2007

Flags Of Our Fathers. Dir. Clint Eastwood. 2006



"Flags Of Our Fathers” é um filme que trabalha a distância entre aqueles que estão dentro da guerra e aqueles que a acompanham através dos noticiários. Uma foto tirada ao acaso durante a conquista Norte-Americana da ilha japonesa de Iwo Jima se transforma em símbolo de vitória e sucesso da empresa bélica americana. Os integrantes da célebre foto são erguidos pelo governo e pela mídia americana ao pedestal de heróis nacionais, mas para eles, não há nada de heróico em “escapar de alguns tiros e ver todo o absurdo de uma batalha”.

O diretor Clint Eastwood não tem receio em mostrar que a foto em questão não tem valor histórico algum, mas foi apenas uma troca de bandeira numa zona do conflito de pouca importância tirada por um soldado qualquer ao acaso. Na realidade, muitos daqueles que figuram na foto morreram instantes depois da foto ser tirada. No entanto, era importante ao governo americano que os “heróis da foto” estivessem vivos para trabalharem nas campanhas publicitárias pedindo a compra de ações para financiar a guerra, através da comoção com os que morreram e do estabelecimento do orgulho nacional. De uma forma nada honrosa o governo americano mendiga doações para tapar o rombo nos cofres públicos diante de uma população já cansada da Guerra.

Flags Of Our Fathers” faz parte de um gigantesco projeto cinematográfico que se completa com o filme “Letters from Iwo Jima”, que Eastwood dirigiu e gravou simultaneamente, mas este último baseado no ponto de vista nipônico do conflito. Diante de um ponto de vista total deste projeto podemos perceber claramente que sob um mesmo momento histórico, uma mesma batalha, se desenrolam histórias muito distintas do ponto de vista daquilo que é considerado a própria honra. Num filme, do lado japonês, vemos o que acontece nos túneis da montanha, no outro, do lado americano, vemos aqueles que sobem a montanha.

Se de um lado acompanhamos o investimento norte americano de ganhar a guerra através da propaganda. Do outro vemos japoneses em defesa do futuro de suas famílias e cultura. Quando as câmeras focalizam apenas o front de batalha fica impossível reconhecer um inimigo, distinguir quem é bom de quem é mau, mas apenas pessoas que lutam cegamente por uma razão que não é a delas.

Bom, finalizando, penso que os dois filmes podem existir separados, e embora formem um paralelo perfeito, uma espécie de negativo um do outro, são suficientes em si mesmos. Mas aconselho a ver os dois, e talvez na ordem que eu vi: Primeiro “Letters From Iwo Jima” e depois “Flags Of Our Fathers”. Mas com certeza absoluta “Letters From Iwo Jima” é um filme muito melhor, embora tenha sido feito por Eastwood um pouco no improviso e na sombra do primeiro.

Veja o Trailer:

terça-feira, 20 de fevereiro de 2007

Letters From Iwo Jima. Dir. Clint Eastwood. 2006.



Existem muitos filmes sobre guerras e batalhas históricas no cinema, mas poucos são realmente bons. “Letters From Iwo Jima” entra nesse seleto grupo. É no mínimo muito curioso que um diretor hollywoodiano, Clint Eastwood, faça num mesmo ano dois filmes sobre um mesmo fato histórico: A Segunda Grande Guerra. O primeiro filme é “A Conquista da Honra” (Flags of Our Fathers - 2006) – Ainda não tive oportunidade de assistir. A diferença entre os dois é o ponto de vista durante a guerra. O primeiro, “Flags of Our Fathers”, aborda a Guerra do ponto de vista americano, enquanto o segundo, “Letters From Iwo Jima”, sustenta o ponto de vista japonês do conflito. É interessante saber que os dois filmes foram rodados simultaneamente pelo mesmo diretor, com o cuidado que nenhum integrante de um elenco apareça nos dois filmes acidentalmente.

Letters From Iwo Jima” é uma adaptação baseada num livro escrito por James Bradley sobre o dramático conflito de 40 dias na ilha japonesa considerada pelo Império japonês o último reduto de resistência no pacífico. A conquista da ilha de Iwo Jima garantiria aos Estados Unidos a rendição de seu adversário. O drama consiste em mostrar a situação precária, mas corajosa, do exército imperial japonês. Tadamichi Kuribayashi (Ken Watanabe) é um respeitado estrategista japonês incumbido de gerenciar o exército imperial para o conflito. Conhecendo o poderio tecnológico do inimigo, pois já estudou nos Estados Unidos, Kuribayashi direciona reformas estratégicas de defesa e supervisiona a construção de túneis nas montanhas que serviriam para desorientar os americanos que chegassem à ilha. Kuribayashi conhece a superioridade do exército inimigo e deve lidar com a escassez de munição, comida e água, além de um exército composto por integrantes despreparados e que por muitas vezes parecem não saber o que estão fazendo na ilha.

É interessante notar que apesar da consciência de todo o exército imperial japonês de que sobreviver era um sonho impossível, eles lutam até o último instante. As cartas que os combatentes da ilha escreveram para suas famílias, como forma de expressão nas noites de solidão bélica, dão voz e espírito aos soldados japoneses mortos na batalha.

Veja o Trailer:

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2007

Little Children. Dir. Todd Field. 2006.

Um filme feito para incomodar , como todos produzidos pelo diretor Todd Field (Entre Quatro Paredes, 2001). Intenda-se isso na melhor acepção da palavra “incômodo”. Nós brasileiros tivemos a infelicidade de conhecer “Little Children” com o título de “Pecados Íntimos”, o que faz com que certas pessoas de pensamentos ortodoxos sintam uma natural repulsa em ver o filme. “Pecados Íntimos” é um título que faz sentido, no entanto, perde muito da significação que o título original traz, porque afinal, a grande sacada do filme é mostrar que as verdadeiras crianças não são aquelas que brincam na piscina pública, que balançam no playground ou vão à escola, mas aquelas que estão aprisionadas dentro dos adultos.

Longe do convencional formato dos tradicionais filmes americanos, “Little Children” lembra um pouco pela sua narrativa o filme “Beleza Americana” e seu conteúdo crítico nos remete ao filme “Closer”. É importante ressaltar estas semelhanças porque elas não são gratuitas. Elas fazem parte de um processo pelo qual o cinema contemporâneo está passando com significativas mudanças de paradigmas de forma e conteúdo que, particularmente, acho muito instigantes.

Um narrador onisciente diz o que passa nas profundezas da consciência de cada personagem, e com um tom bastante irônico faz críticas aos costumes e a hipocrisia da sociedade norte-americana. Uma pacata e arborizada cidade do interior recebe de volta um aliciador de menores liberto após cumprir legalmente sua pena, a cidade toda fica alerta com qualquer movimentação suspeita deste indivíduo. O filme retrata de forma bastante pontual a relação entre jovens pais e filhos, carrinhos de bebê, horário de lanche, diversão e escola. É tudo como se houvessem duas histórias paralelas, a das crianças, e a dos adultos e suas infantilidades. Sarah(Kate Winslet) é uma mãe jovem casada com Richard (Gregg Edelman),um viciado em pornografia na internet, e mãe da geniosa Lucy de três anos de idade. Cansada e frustrada com sua vida nada excitante, Sarah sente-se antiquada no contato com as outras mães que levam seus filhos para o playground, pois vê que não tem muitas qualidades como uma boa dona de casa deveria ter. Sarah sentindo-se atraída por Brad Adamson (Patrick Wilson), um jovem pai que mente para sua esposa quando diz que vai à biblioteca, vê um novo horizonte para sua vida. O que une o casal numa relação extra-conjugal é mais um apetite de mudança e transgressão da norma, pois ambos vêem incompatibilidade em seus papéis, do que apenas um desejo sexual.

A figura do adulto e a do infantil se confunde durante toda a trama. A cena, na minha opinião mais significativa, foi quando Sarah chora no colo de sua pequena filha pedindo desculpas após pegá-la para fugir com Brad. O diretor Todd Field intenta mostrar em seu filme de maneira bastante nítida o despreparo de uma geração em assumir responsabilidades inerentes a uma vida adulta, além de nos tocar viceralmente num ponto essencial para reflexão: Até que ponto um ser humano tem o direto de castrar seus impulsos?

“Little Children” não é um filme sobre crianças, ou melhor, é um filme sobre crianças muito peculiares que têm uma idade já nada infantil. Ainda digo mais, e isso digo por mim, parece inútil o homem tentar lutar contra seus desejos, pois é isso o que ele é em essência: Desejo. Este filme esclarece muito isso. Quanto mais o homem abandona o sentir em função do entender, mais longe de entender algo ele fica.


Veja o Trailer:

terça-feira, 13 de fevereiro de 2007

Lilja 4-ever. Dir. Lukas Moodysson. 2002.



Um filme do suéco Lukas Moodysson. Essa afirmação já dispensa muitos comentários. O mesmo diretor do instigante filme “Fucking Åmål” (1998), coloca nas telas mais uma vez um filme em que a adolescência e a sexualidade são os focos. Enquanto assistia ao filme pensei algo muito instantâneo: Se existe um cara que entende de mulher... Com certeza é Moodyson. Não me assustei tanto com o dogmatismo de meu pensamento, porque este fato é muito palpável para qualquer um que veja o filme, mas pela instantaneidade com que isso foi pensado por mim. Qualquer comentário que eu possa fazer não fica aos pés da representatividade deste filme.

A história é muito simples, mas o enfoque é realisticamente chocante e surpreendentemente emocionante. Em algum lugar da antiga União Soviética vive Lilya (Oksana Akinshina), uma menina de 16 anos de idade que foi abandonada pela mãe que foi aos Estados Unidos para viver com o namorado. Sozinha e num ambiente nada sugestivo para uma adolescente, Lilya conhece Volodya (Artyom Bogucharsky), um garoto bem mais novo do que ela por quem ela cria um forte laço de amizade, carinho e respeito. No entanto, a miséria do local onde Lilya mora e a falta de oportunidade profissional impulsionam ela para entrar na prostituição. Envolvida em seu meio de subsistência, Lilya conhece um jovem que aparentemente pode lhe propiciar uma nova vida. Este jovem estrangeiro de forma aparentemente desinteressada começa a seduzir Lilya inserindo sonhos em sua mente de vida melhor e trabalho na Suécia. Imbuída por esse desejo e completamente cega pela paixão Lilya aceita as ofertas de seu namorado. Ao chegar na Suécia é presa por um homem e obrigada a trabalhar como escrava sexual.

Bastante pesado e triste, este drama traz elementos muito visíveis para reflexão. Uma história que se repete centenas de vezes, basta olhar nos jornais. Embora não podemos ter certeza do que aconteceu com a mãe de Lilya, podemos imaginar que seu destino não deve ter sido mais feliz. Lilya mostra coragem para determinar-se a uma mudança de vida e se vê num momento seguinte frustrada com a mentira de quem amou. Tudo isso de forma muito real, sem romantismos desnecessários.

Moodysson não cai no clichê de apenas mostrar a imigração de pessoas do leste europeu em busca de uma nova vida. Trata-se de um filme bastante particular que mostra a vida de uma adolescente particular, num ambiente particular com seus problemas particulares. Se Lilya percebe que ali onde mora não pode ser feliz, pois está na miséria, abandonada pela família e pelos amigos, ela imagina que fora dali está a solução de seus problemas, mas infelizmente descobre que seus problemas podem estar em qualquer parte. Negando a fé e a esperança em entidades abstratas Moodysson retrata um drama que é em vários momentos repulsivo, mas marcante e emocionante. "Para Sempre Lilya" é um filme paradigmático, com uma história bem contada e muito bem fimada. Nunca vi aplaudirem um filme no cinema, mas nessa seção foi diferente, pois até eu pude aplaudi-lo.

Veja o Trailer:

domingo, 11 de fevereiro de 2007

The Ice Storm. Dir. Ang Lee. 1998.


Mudanças de pensamento e comportamento na vida privada de pessoas comuns. Na realidade é sempre muito problemático afirmar que haja algo de comum na vida de uma pessoa qualquer. Baseado no livro homônimo de Rick Moody, o filme “Tempestade de gelo” dirigido por Ang Lee tem o intuito de focalizar e identificar diferenças específicas na constituição de cada personalidade no interior da busca por alguma forma de padronização e enquadramento numa eventual normalidade.

Os acontecimentos têm como localização histórica a década de 70 acompanhada da onda liberalista crescente nos Estados Unidos. A família Hood enfrenta uma série de crises, a começar por Ben Hood (Kevin Kline) que enfrenta problemas de relacionamento com sua esposa, Elena Hood (Joan Allen), e tem um relacionamento constante com sua vizinha e amiga íntima da família, Janey Carver (Sigourney Weaver). Elena tenta dar pouca importância à infidelidade do marido se focando em outras prioridades, tais como o filho que vai para a faculdade, ou os próprios afazeres do lar.

Sem contar o “jogo” dos adultos, temos, por outro lado, a pré-adolescente Wendy (Christina Ricci), filha de Ben e Elena, que submersa em carências afetivas e na confusão da descoberta de sua sexualidade se lança num “jogo” de sedução com os irmãos Mikey Carver (Elijah Wood) e Sandy Carver (Adam Hann-Byrd), filhos de Janey. Mikey é um jovem intelectual apaixonado por matemática e ciência. Sandy, o irmão mais novo, passa a maior parte do seu tempo explodindo seus brinquedos no jardim. O irmão mais velho de Wendy, Paul (Tobey Maguire) se vê apaixonado por uma garota da faculdade que se mostra profundamente crítica e instigante, no entanto sente-se iludido ao perceber que ela tem hábitos nada convencionais.

É magistral a forma como Ang Lee conduz os personagens à luz no decorrer da trama. Uma luz que nunca é suficiente para iluminar toda a profundidade dos personagens, mas que apenas serve para mostrar que são complexos e insuficientes em si mesmos. Numa noite de forte tempestade os adultos vão para uma festa onde são levados a participarem do “jogo das chaves”. A única regra do jogo é que os homens coloquem a chave de seus veículos num vaso e as mulheres retiram uma a uma, o homem que tem sua chave retirada por uma dada mulher deve ir para o carro com ela. Paralelamente uma catástrofe acontece durante a tempestade. Esta é uma noite significativa para a família Wood que terá muitas coisas a que aprender.

sábado, 10 de fevereiro de 2007

Little Miss Sunshine. Dir. Jonathan Dayton. 2006.


Uma Kombi amarela e uma família muito longe da normalidade. Está certo que nenhuma família é normal... Mas os Hoovers “não dão para o cheiro”. O pai da família Hoover, Richard (Greg Kinnear), é um palestrante motivacional que descobriu os nove passos para alcançar a felicidade e o sucesso. Perfeccionista ao extremo, sua meta é vender seu programa de auto-ajuda para ganhar estabilidade financeira. A mãe, Sheryl (Toni Collette), guarda a sete chaves seu vício pelo tabaco. Frank (Steve Carell) é o tio, um acadêmico frustrado especialista no escritor francês Marcel Proust. Enfrentando problemas de correspondência amorosa num relacionamento gay, Frank tenta se matar e é encaminhado pelos médicos a ir morar com a família Hoover. O avô (Alan Arkin), um velho expulso do asilo por causa do consumo de heroína. Os Hoovers se completam com as crianças e seus sonhos improváveis. O primeiro é Dwayne (Paul Dano), um adolescente que fez voto de silêncio com a finalidade de entrar na força aérea. “Devoto” leitor de Nietzsche, sente ódio de sua família por ver a “fraqueza” e loucura de cada um de seus membros. Para finalizar temos Olive (Abigail Breslin), uma menina determinada a ser miss sunshine, mas que não abre mão de um sorvete.

A comédia começa por trazer à tela figuras muito originais, mas numa composição que ressalta uma certa desconexão, uma desarmonia, no entanto, são movidas por um único objetivo: realizar o desejo de Olive em participar do concurso de beleza “Little miss sunshine”. Com dificuldades econômicas, os Hoovers se lançam à estrada numa Kombi amarela enferrujada para cruzar grande parte dos Estados Unidos, do estado do Novo México até a Califórnia. O filme é composto por aquilo que chamamos de humor negro. A viajem dura três dias e todas as tragédias que ocorrem no caminho nos mata de rir, não por aquilo que elas são em si mesma, mas pelas novas situações em que cada figura da família se vê a cada instante.

As manias e os desajustes de cada integrante da família Hoover parecem ser muito pequenos quando se unem na realização do sonho de Olive. Eles se deparam com uma nova experiência, a da união. É bastante nítida a mudança de cada personagem no decorrer do filme, quando eles aprendem que o vencedor é aquele que não desiste de competir. Se a personagem Olive não foi Miss Sunshine, ainda há grande possibilidade de sua atriz, Abigail Breslin, receber um Oscar nesse ano. Ela foi impecável!

Site oficial do Filme

Veja o Trailer: