sexta-feira, 16 de fevereiro de 2007

Little Children. Dir. Todd Field. 2006.

Um filme feito para incomodar , como todos produzidos pelo diretor Todd Field (Entre Quatro Paredes, 2001). Intenda-se isso na melhor acepção da palavra “incômodo”. Nós brasileiros tivemos a infelicidade de conhecer “Little Children” com o título de “Pecados Íntimos”, o que faz com que certas pessoas de pensamentos ortodoxos sintam uma natural repulsa em ver o filme. “Pecados Íntimos” é um título que faz sentido, no entanto, perde muito da significação que o título original traz, porque afinal, a grande sacada do filme é mostrar que as verdadeiras crianças não são aquelas que brincam na piscina pública, que balançam no playground ou vão à escola, mas aquelas que estão aprisionadas dentro dos adultos.

Longe do convencional formato dos tradicionais filmes americanos, “Little Children” lembra um pouco pela sua narrativa o filme “Beleza Americana” e seu conteúdo crítico nos remete ao filme “Closer”. É importante ressaltar estas semelhanças porque elas não são gratuitas. Elas fazem parte de um processo pelo qual o cinema contemporâneo está passando com significativas mudanças de paradigmas de forma e conteúdo que, particularmente, acho muito instigantes.

Um narrador onisciente diz o que passa nas profundezas da consciência de cada personagem, e com um tom bastante irônico faz críticas aos costumes e a hipocrisia da sociedade norte-americana. Uma pacata e arborizada cidade do interior recebe de volta um aliciador de menores liberto após cumprir legalmente sua pena, a cidade toda fica alerta com qualquer movimentação suspeita deste indivíduo. O filme retrata de forma bastante pontual a relação entre jovens pais e filhos, carrinhos de bebê, horário de lanche, diversão e escola. É tudo como se houvessem duas histórias paralelas, a das crianças, e a dos adultos e suas infantilidades. Sarah(Kate Winslet) é uma mãe jovem casada com Richard (Gregg Edelman),um viciado em pornografia na internet, e mãe da geniosa Lucy de três anos de idade. Cansada e frustrada com sua vida nada excitante, Sarah sente-se antiquada no contato com as outras mães que levam seus filhos para o playground, pois vê que não tem muitas qualidades como uma boa dona de casa deveria ter. Sarah sentindo-se atraída por Brad Adamson (Patrick Wilson), um jovem pai que mente para sua esposa quando diz que vai à biblioteca, vê um novo horizonte para sua vida. O que une o casal numa relação extra-conjugal é mais um apetite de mudança e transgressão da norma, pois ambos vêem incompatibilidade em seus papéis, do que apenas um desejo sexual.

A figura do adulto e a do infantil se confunde durante toda a trama. A cena, na minha opinião mais significativa, foi quando Sarah chora no colo de sua pequena filha pedindo desculpas após pegá-la para fugir com Brad. O diretor Todd Field intenta mostrar em seu filme de maneira bastante nítida o despreparo de uma geração em assumir responsabilidades inerentes a uma vida adulta, além de nos tocar viceralmente num ponto essencial para reflexão: Até que ponto um ser humano tem o direto de castrar seus impulsos?

“Little Children” não é um filme sobre crianças, ou melhor, é um filme sobre crianças muito peculiares que têm uma idade já nada infantil. Ainda digo mais, e isso digo por mim, parece inútil o homem tentar lutar contra seus desejos, pois é isso o que ele é em essência: Desejo. Este filme esclarece muito isso. Quanto mais o homem abandona o sentir em função do entender, mais longe de entender algo ele fica.


Veja o Trailer:

Um comentário:

Felipe Silva disse...

Não Shirley! Em filosofia não dizemos tudo o que queremos. Filosofia tem método e rigor.

Sobre o filme, se digo que "incomoda" é porque possui elementos que transferimos do filme para a realidade particular de nossas vidas, e o incômodo está em admitir isso.

Abraços