sábado, 12 de agosto de 2006

Estamira. Dir Marcos Prado. 2006


Mais do que a vida de uma mulher no subúrbio do Rio de Janeiro, o documentário “Estamira”, do diretor Marcos Prado, coloca diante de nossos olhos uma realidade que causa, de um ponto de vista, indignação, pelas sub-condições de vida em que se sujeitam pessoas como a personagem retratada; e por outro lado, causa espanto, porque nos provoca a seguinte questão: loucos, quem são?

Estamira é uma mulher de 63 anos de idade que há vinte anos trabalha no aterro sanitário do Rio de Janeiro. O cenário é a imagem da constante deteriorização do mundo pós-moderno; ele machuca, agride, confunde o personagem inserido nele. Há momentos em que podemos perceber o vento e a forte chuva como que destruindo, levando, todo o resto daquilo que um dia foi envolto pelo fetichismo dos mercados da Internet, dos shoppings, enfim, da mídia; tornando realidade aquele dito de Marx que todo mundo já ouviu e repete sem saber do que se trata: “tudo o que é sólido se desmancha no ar”. A história de Estamira é relatada na medida do necessário, flashes de fotos antigas, relatos de filhos, e lembranças dela mesma. Seu impasse com os remédios psiquiátricos e o medo de ir para o hospício também são trazidos á cena...

O documentário de Marcos Prado trata de dois problemas sociais de longa data, a miséria e a questão da loucura. O que espanta é que o documentário tende à uma grande ficção, a ficção das idéias de Estamira. Para ser sincero, o espectador perde o parâmetro do que é ficção ou realidade pois a coerência de Estamira, que sempre fala com muita autoridade, nos leva a indagar o mundo fora do lixão. Quem são os loucos?

Ditos de Estamira:

A minha missão, além d’eu ser Estamira, é revelar a verdade, somente a verdade. Seja mentira, seja capturar a mentira e tacar na cara, ou então ensinar a mostrar o que eles não sabem, os inocentes… Não tem mais inocente, não tem. Tem esperto ao contrário, esperto ao contrário tem, mas inocente não tem não.

Eu Estamira sou a visão de cada um. Ninguém pode viver sem mim. Ninguém pode viver sem Estamira. E eu me sinto orgulho e tristeza por isso. Porque eles, os astros Negativos ofensivos, sujam os espaço e quer-me. Quer-me, e suja tudo. A criação toda é abstrata. Os espaço inteiro é abstrato. A água é abstrato. O fogo é abstrato. Tudo é abstrato. Estamira também é abstrato.

A Terra disse, ela falava, agora que ela já tá morta, ela disse que então ela não seria testemunha de nada. Olha o quê que aconteceu com ela. Eu fiquei de mal com ela uma porção de tempo, e falei pra ela que até que ela provasse o contrário. Ela me provou o contrário, a Terra. Ela me provou o contrário porque ela é indefesa. A Terra é indefesa. A minha carne, o sangue, é indefesa, como a Terra; mas eu, a minha áurea não é indefesa não. Se queimar os espaço todinho, e eu tô no meio, pode queimar, eu tô no meio, invisível. Se queimar meu sentimento, minha carne, meu sangue, se for pra o bem, se for pra verdade, pra o bem, pela lucidez de todos os seres, pra mim pode ser agora, nesse segundo, e eu agradeço ainda.

Site oficial do Documentário

6 comentários:

Felipe Silva disse...

post escriptum: Durante muitos momentos em que assistia o filme, lembrava do filme Matrix, onde a realidade é ocultada por um ilusionismo virtual. Não é Estamira que está nesse ilusionismo, mas as pessoas fora do lixão...

Felipe Silva disse...

Acho que o que insitou- me a pensar nisso é o cenário e a idéia do filme Mtrix de "Deserto do real", não há nada significativo em si mesmo no mundo...

Valeria Elías disse...

Bueno Felipe, siempre ofreces cosas que verdaderamente prometen, la verdad es que me admira la capacidad que tienes de relatar sintéticamente las historias y la pasión con que lo haces... Adoro el cine y su hijo el documental... jeje
Espero algún día podamos compartir algún debate sobre el tema, besos

Valeria Elías disse...

Hola Feli! pasé a saludar... gracias por el comentario... bueo, continúo la recorrida jejeje besos en la frente jejeje

Anônimo disse...

Fe,

gostei muito do que vc escreveu sobre Estamira, ajudou muito para a minha crítica que vou entregar amanhã!
Essa semana vou assistir o Sabor da Melancia, quer ir?
bjs

Anônimo disse...

O vídeo que conta a história de Estamira retrata a verdade social que o Brasil possui, a verdade que ficou colocada em baixo do tapete por muito tempo, mas que aos poucos vem sendo revelada, a verdade que os políticos só vivenciam em períodos eleitorais, sempre para criticar quem está no mandato atual, com promessas hipócritas que já não são mais eivadas de credibilidade por boa parte dos nacionais. Analisando a protagonista do vídeo tão somente como mulher, torna-se fácil uma qualificação denegridora de louca, atéia ou nojenta, pois, como ela mesma disse: “Eu sou a visão de cada um”. No entanto, é preciso que se avalie o aspecto subjetivo dos acontecimentos. Viver em um país caracterizado pela discriminação quando se possui um só fator que assim o qualifique já é assombroso, entretanto, essa condição torna-se ainda mais estarrecida quando uma só pessoa possui um conjunto de tais aspectos, como: a pobreza, a cor negra, o abuso sexual sofrido com os estupros, a “loucura” e a própria “profissão” de catadora de lixo. Estamira representa a vida infeliz que muitos brasileiros vivem no dia-a-dia através, entre outros, das drogas, do abandono de crianças, dos hospícios e da acentuação imensurável de crimes bárbaros, comprovando ainda mais a falta de Deus e de amor no coração dos humanos. Vendo Estamira é impossível não lembrar o poema de Manuel Bandeira que assim diz:
Vi ontem um bicho,
Na imundície do pátio,
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um
homem.
Que pena que o pouco estudo dos governantes e políticos “não é o suficiente” para lhes proporcionar reflexões e maturidade para ao menos tentarem melhorar a condição deplorável em que algumas vítimas do próprio ser humano vivem. Saber o que é preciso para uma mudança para melhor todos sabem, o que falta é, propriamente, atitude. Gandi disse: “Seja você a mudança que espera ver no mundo”. Por isso começamos hoje a fazer o que as autoridades não fazem desde a época em que eles começaram a profetizar mentiras, ou seja, desde o surgimento das mesmas.
O DOCUMENTÁRIO É FASCINANTE E TEMOS UTILIZADO COMO MATERIAL DE APROFUNDAMENTO EM NOSSAS AULAS DE DIREITO AMBIENTAL NA UNIVERSIDADE DE FORTALEZA... GOSTARIA MUITO DE MANTER ALGUM CONTATO VIA EMAIL COM O DIRETOR MARCOS PRADO...MEU EMAIL EUFRASIO@UNIFOR.BR...
PROF. CARLOS EUFRASIO